CIDH condena Brasil por desaparecimento de jovens em 1990
CIDH condena Brasil por desaparecimento de jovens.
Notícia publicada em 05/12/2024 13:50 - #sociedade_comportamento
A Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) decidiu condenar o Brasil pelo desaparecimento forçado de 11 jovens que moravam na favela de Acari, localizada na zona norte do Rio de Janeiro. Este triste episódio ocorreu em 1990 e levou à formação do grupo de ativistas conhecido como Mães de Acari. A sentença foi divulgada na quarta-feira, dia 4, em San José, capital da Costa Rica, onde a CIDH tem sua sede.
A CIDH é uma instituição judicial independente que faz parte da Organização dos Estados Americanos (OEA). Seu principal objetivo é aplicar e interpretar a Convenção Americana, um tratado internacional que protege os direitos e liberdades dos cidadãos. O Brasil é um dos 20 países que reconhecem a autoridade da CIDH.
O caso que resultou na condenação do Brasil remonta ao dia 26 de julho de 1990, quando os 11 jovens desapareceram enquanto estavam em um sítio em Magé, um município próximo ao Rio de Janeiro. Naquela noite, cerca de seis homens encapuzados invadiram a casa da avó de uma das vítimas e sequestraram os jovens, alegando serem agentes da polícia. Esses homens pertenciam a um grupo de extermínio conhecido como Cavalos Corredores, que operava na favela de Acari e era formado por policiais.
Desde o dia do sequestro, o paradeiro dos jovens permanece desconhecido. A CIDH ressaltou que a maioria das vítimas era composta por adolescentes, com idades entre 13 e 18 anos, e que a maioria das famílias ainda não conseguiu obter as certidões de óbito dos desaparecidos.
A Sentença da CIDH
A Corte Interamericana observou que um processo judicial no Brasil foi arquivado em 2011 devido à falta de provas. Além disso, a ação de reparação movida por alguns familiares contra o Estado do Rio de Janeiro também prescreveu. A CIDH destacou que Edmea da Silva Euzébio, mãe de uma das vítimas e líder das Mães de Acari, foi assassinada em 1993, pouco após denunciar a participação de policiais nos desaparecimentos. Sua sobrinha também foi morta na mesma ocasião.
As Mães de Acari se tornaram conhecidas por sua luta incessante por justiça e responsabilização pelos crimes cometidos. O movimento continua ativo até hoje. Em abril deste ano, os policiais acusados pelo desaparecimento dos jovens foram absolvidos por falta de provas.
Os juízes da CIDH afirmaram que o Estado brasileiro violou os direitos dos jovens ao não garantir o reconhecimento da personalidade jurídica, a vida, a integridade pessoal e a liberdade. Além disso, a Corte criticou a falta de uma investigação séria e eficaz sobre o caso.
Medidas de Reparação
Como resultado da condenação, o Brasil foi obrigado a tomar várias medidas, incluindo: - Continuar as investigações sobre o desaparecimento dos jovens; - Realizar uma busca rigorosa para encontrar os desaparecidos; - Promover um ato público de reconhecimento da responsabilidade internacional; - Criar um espaço de memória no bairro de Acari; - Oferecer atendimento médico e psicológico às famílias; - Proporcionar reparação financeira às vítimas; - Elaborar um estudo sobre a atuação de milícias e grupos de extermínio no Rio de Janeiro.
Reações das Famílias
Rosangela da Silva, irmã de Luiz Henrique da Silva Euzébio, expressou que a sentença trouxe um sentimento de renascimento para sua família. Ela comentou que foram 34 anos de sofrimento e busca por justiça, e que agora, mesmo tendo que recorrer a um órgão internacional, finalmente tiveram uma resposta positiva.
Aline Leite de Souza, irmã de Cristiane, uma das vítimas, também se manifestou. Ela representou a memória de Vera Lúcia Flores, uma das Mães de Acari que já faleceu. Aline afirmou que esperava que a justiça não demorasse tanto e que a sentença é uma forma de o Brasil reescrever a história, dando dignidade às famílias.
Antes de ser levado à CIDH, o caso já havia passado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que em 2006 fez recomendações ao Brasil que não foram cumpridas, levando à necessidade de uma instância superior.
Repercussão da Decisão
A coordenadora da ONG Criola, Lúcia Xavier, elogiou a decisão da CIDH, considerando-a uma correção na política do Estado em relação a violências desse tipo. Ela destacou a importância de não normalizar o desaparecimento forçado e a necessidade de o Brasil acabar com essas práticas.
O advogado Guilherme Pimentel, que coordena um projeto da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, também comentou que a sentença é um marco na luta pelos direitos humanos no Brasil. Ele enfatizou que as violações cometidas por agentes públicos não são investigadas adequadamente, deixando as famílias sem acesso à verdade e à justiça.
O Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania do Brasil classificou a decisão como histórica e se comprometeu a implementar as medidas determinadas pela CIDH. A Secretaria estadual de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos do Rio de Janeiro também informou que está acompanhando o caso e oferecendo suporte às famílias.
A decisão da CIDH representa um passo importante na luta contra a impunidade e na busca por justiça para as vítimas e suas famílias, que esperam que o Brasil respeite plenamente os direitos humanos.